Códigos Numéricos na Eletrônica Digital


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1. Códigos Numéricos: O Segredo da Comunicação entre Circuitos

Na eletrônica digital, tudo funciona com base em níveis de tensão que representam dois estados possíveis: 0 e 1. Mas, para representar números, letras, comandos e símbolos, é preciso transformar essas informações em padrões binários padronizados. A isso damos o nome de códigos numéricos.

Esses códigos são conjuntos de regras que traduzem informações compreensíveis aos humanos (como números decimais, letras ou sinais) para uma forma que os circuitos eletrônicos consigam processar e interpretar — e vice-versa. Um exemplo clássico e histórico é o Código Morse, um dos primeiros sistemas de codificação usado em telegrafia para transmitir mensagens através de sinais curtos (pontos) e longos (traços). Embora não binário, ele representa bem o conceito de converter informação em forma codificada para transmissão e interpretação posterior.

Com o avanço da eletrônica, os códigos passaram a ser utilizados de forma sistemática e padronizada, permitindo desde simples contagens binárias até a comunicação de texto, imagens e sons em sistemas digitais complexos. Mas para que esses dados façam sentido em um circuito, são usados dois blocos essenciais:

  • Codificadores: convertem uma entrada simbólica ou decimal em sua representação binária;

  • Decodificadores: fazem o processo inverso, convertendo códigos binários em saídas compreensíveis, como números em um display ou comandos em um sistema.

Assim, os códigos numéricos e seus correspondentes sistemas de codificação são a ponte entre o mundo analógico e o digital, sendo aplicados em displays, memórias, comunicação de dados, CLPs, microcontroladores e muito mais.

Abaixo listamos os códigos mais relevantes e que você encontrará com frequência no estudo e aplicação da eletrônica digital:

  • Código Binário Puro (Natural ou Posicional)

  • Código BCD (Binary-Coded Decimal)

  • Código Gray

  • Código ASCII (American Standard Code for Information Interchange)

  • Código Excess-3 (XS-3)

  • Código Octal e Hexadecimal (usados como forma compacta de representar binário) - Leia Sistemas de Numeração na Eletrônica Digital

  • Código 7 segmentos (usado em displays)

  • Código Paridade (Detecção de Erros)

  • Código Unicode (em sistemas mais complexos e modernos)

1.1. Código Binário Puro (ou Binário Posicional)

O Código Binário Puro é o mais simples e fundamental de todos os códigos numéricos. Ele utiliza apenas dois símbolos (ou dígitos):

  • 0, representando a ausência de tensão (nível lógico baixo);

  • 1, representando a presença de tensão (nível lógico alto).

Esses dígitos são chamados de bits (binary digits), e podem ser organizados em sequências de 2, 3, 4 ou mais bits para representar valores numéricos.

📌 Por que “posicional”?

Porque cada bit tem um peso, que depende da sua posição na sequência, contada da direita para a esquerda. Esses pesos são potências de 2:

Posição (bit)
Peso 8 4 2 1

Assim, o número binário 1010 significa:

1×8 + 0×4 + 1×2 + 0×1 = 10 (decimal)

Tabela de conversão binário–decimal (4 bits)

Aplicações do Código Binário Puro

  • Contadores digitais (como em Arduino ou CI 4026);

  • Memórias digitais, onde cada endereço é codificado em binário;

  • Portas lógicas e circuitos combinacionais;

  • Programação de microcontroladores, onde tudo é convertido para instruções binárias;

  • Comunicação serial, como UART e SPI.

Exemplo prático: LED ligado por posição binária

Imagine 4 LEDs ligados a 4 pinos digitais de um microcontrolador. Se você quer ligar apenas o 1º e o 3º LEDs, você enviaria o valor binário 0101, que em decimal é 5.

Ou seja, o número binário pode representar diretamente quais saídas serão ativadas.

1.2. Código BCD (Decimal Codificado em Binário)

O Código BCD (Binary-coded decimal) é uma forma de representar números decimais (0 a 9) utilizando quatro bits para cada dígito decimal. Ao contrário do binário puro, que representa o número inteiro em binário, o BCD converte cada dígito decimal separadamente para sua forma binária.

Como funciona o BCD?

Vamos usar o número 47 como exemplo:

  1. No sistema decimal: 4 e 7

  2. Em BCD:

    • 4 = 0100

    • 7 = 0111

  3. Logo, 47 em BCD = 0100 0111

Perceba que cada dígito é convertido separadamente, e não o número como um todo. Em binário puro, 47 seria 101111, mas em BCD é 0100 0111.

Tabela de Conversão Decimal → BCD

Atenção: No BCD não existem valores binários acima de 1001 (9). Combinações de 1010 a 1111 são inválidas em BCD.

Aplicações do Código BCD

  • Display de 7 segmentos: usados em relógios digitais, calculadoras e multímetros;

  • Contadores decimais, como os CIs CD4026 ou 74LS90;

  • Interfaces homem-máquina, onde a exibição precisa ser intuitiva (decimal);

  • Conversores A/D e D/A com interface numérica amigável.

Exemplo prático: Exibição no display de 7 segmentos

Suponha que você deseje exibir o número 93 em dois dígitos:

  • Decimal 9 = 1001

  • Decimal 3 = 0011

  • Então, BCD = 1001 0011

Esses dois conjuntos de 4 bits são enviados separadamente para dois decodificadores BCD para 7 segmentos, como o CD4511 ou 7447, que acendem os segmentos correspondentes no display.

Vantagens do BCD

  • Facilita a exibição de números decimais em sistemas digitais;

  • Evita conversões complexas entre binário e decimal para leitura humana;

  • É amplamente suportado por CIs especializados.

1.3. Código Gray (Código Refletido ou Código Binário Refletido)

O Código Gray é um sistema de codificação binária onde apenas um bit muda por vez entre dois valores consecutivos. Isso é fundamental para evitar erros em transições rápidas de estados, como ocorre em encoders rotativos, sensores angulares, e sistemas de controle.

📌 O que é o Código Gray?

Diferente do binário puro, onde múltiplos bits podem mudar de um número para o outro (ex. binário puro: de 3 para 4 muda de 0011 para 0100, ou seja, 3 bits mudam), no Código Gray sempre muda apenas um bit de cada vez.

Essa característica reduz a possibilidade de leituras erradas causadas por atrasos na propagação de sinais, principalmente em circuitos digitais de alta velocidade.

Tabela: Binário Puro vs. Código Gray (4 bits)

Como converter Binário para Gray?

Regra:

  • O primeiro bit (mais significativo) é mantido;

  • Cada bit seguinte é obtido com a operação XOR entre o bit anterior e o bit atual do binário original.

Exemplo: Converter Binário 1011 para Gray

  1. Primeiro bit → 1

  2. 1 XOR 0 = 1

  3. 0 XOR 1 = 1

  4. 1 XOR 1 = 0

Resultado Gray: 1110

Como converter Gray para Binário?

Regra:

  • O primeiro bit do binário é o mesmo que o primeiro do Gray;

  • Para os próximos bits: se o bit atual do Gray for 0, o bit seguinte do binário é igual ao anterior; se for 1, o bit seguinte é o inverso do anterior.

Exemplo: Converter Gray 1110 para Binário

  1. Primeiro bit: 1

  2. Gray: 1 → inverter anterior → 0

  3. Gray: 1 → inverter anterior → 1

  4. Gray: 0 → manter anterior → 1

Resultado Binário: 1011

⚙️ Aplicações do Código Gray

  • Encoders rotativos (sensores de posição angular);

  • Sistemas de controle com transições rápidas de estado;

  • Memórias de leitura assíncrona (evita erros de sincronização);

  • Sistemas de comunicação digital com ruído de transição.

✅ Vantagens do Código Gray

  • Reduz erros de leitura durante transições de estados;

  • Ideal para medição precisa de movimento;

  • Usado em hardware industrial, robótica, instrumentação eletrônica e eletrônica médica.

1.4. Código ASCII – American Standard Code for Information Interchange

O ASCII (pronuncia-se áski) é um código padronizado desenvolvido na década de 1960 para representar caracteres alfabéticos, numéricos e símbolos de controle em dispositivos digitais, como computadores, microcontroladores e sistemas de comunicação.

O que é o Código ASCII?

O Código ASCII original usa 7 bits para representar 128 caracteres únicos, que incluem:

  • Letras maiúsculas e minúsculas do alfabeto latino;

  • Dígitos numéricos de 0 a 9;

  • Símbolos especiais como !, @, #, %, +, etc.;

  • Caracteres de controle como Enter (CR), Backspace, ESC, entre outros.

Exemplo:
A letra 'A' é representada por 01000001 (binário) ou 65 (decimal).
O número '0' é representado por 00110000 (binário) ou 48 (decimal).

ExemploTabela ASCII (parcial)

Nota: Há também extensões ASCII (8 bits) com até 256 códigos, incluindo acentos e símbolos gráficos.

Aplicações do ASCII

  • Comunicação entre dispositivos digitais, como computadores e impressoras;

  • Programação em linguagens como C, C++, Python, Arduino, etc.;

  • Protocolos de comunicação serial (UART, RS-232), onde os dados são enviados como bytes ASCII;

  • Exibição de texto em LCDs e displays alfanuméricos.

ASCII no Arduino

Em sistemas embarcados, como o Arduino, o uso de ASCII é essencial para interações com monitores seriais, LCDs, e módulos de comunicação.

Serial.print('A');  // Envia 65 (ASCII de A)
Serial.println((int)'A'); // Imprime 65 como número

✅ Vantagens do Código ASCII

  • Padrão universalmente aceito;

  • Simples de implementar em hardware e software;

  • Ideal para comunicação entre humanos e máquinas.

1.5. Código Excess-3 (XS-3) – Codificação BCD com Offset

O Código Excess-3, também chamado de XS-3, é um tipo especial de código BCD (Decimal Codificado em Binário) com um deslocamento (offset) de +3 aplicado a cada dígito decimal.

O que é o Código Excess-3?

O Excess-3 é um código binário ponderado, autocomplementar, usado para representar números decimais (0 a 9) em sistemas digitais.

Ele funciona adicionando o valor decimal 3 (0011 em binário) ao dígito decimal antes de convertê-lo para binário de 4 bits. Por isso, é chamado de "excesso de 3" (excess-3).

Como funciona?

A codificação se dá pela seguinte fórmula:

XS-3 = Decimal + 3 → Representado em binário de 4 bits

Tabela de exemplo do código Excess-3

Observação: Veja que o código XS-3 nunca gera valores binários inferiores a 0011 (3 em decimal), pois o 0 decimal já começa com o binário 0011.

Características do Código XS-3

  • Autocomplementar: o complemento de 9 de um número decimal pode ser obtido simplesmente invertendo todos os bits do código XS-3 (útil em subtrações).

  • Cada código XS-3 tem 4 bits, como o BCD, facilitando sua manipulação por circuitos digitais.

  • 🚫 Não é um código natural: o código XS-3 não representa diretamente os valores binários decimais comuns.

  • ✅ É auto-sincronizável: útil em transmissões digitais.

Comparação: BCD x XS-3

Aplicações do Código Excess-3

  • Utilizado em calculadoras e sistemas aritméticos digitais para facilitar operações de subtração usando complemento de 9;

  • Empregado em códigos de detecção de erro, pois evita o uso de sequências totalmente 0s ou 1s;

  • Relevante em sistemas de conversão entre representações numéricas, como conversores BCD ↔ XS-3.

💡 Vantagens do XS-3

  • Reduz erros na manipulação binária de números decimais;

  • Permite operação de subtração usando complementos sem a necessidade de hardware adicional;

  • Facilita a construção de sistemas lógicos e ALUs (Unidades Lógicas e Aritméticas) baseadas em decimal.

1.6. Código de 7 Segmentos

O código de 7 segmentos é um padrão de representação numérica e, em alguns casos, alfabética, utilizado principalmente em displays de LED ou LCD. Esses displays são compostos por sete elementos luminosos retangulares (segmentos) dispostos de forma a formar números e alguns caracteres.

Cada segmento é identificado por uma letra de a a g, e pode ser aceso ou apagado para compor a figura desejada. A configuração ligada/desligada desses segmentos segue uma codificação binária, onde cada bit indica o estado de um segmento específico.

   —a—
  |     |
  f     b
  |     |
   —g—
  |     |
  e     c
  |     |
   —d—
  • a, b, c, d, e, f, g → segmentos controlados individualmente.

  • Um ponto decimal opcional (chamado DP ou dot) pode ser adicionado.

Por exemplo:

Codificação Binária para Controle

No uso prático, os segmentos são controlados por sinais digitais (normalmente nível alto para ligar e nível baixo para desligar, ou vice-versa, dependendo se o display é de ânodo comum ou cátodo comum).
Cada combinação de segmentos pode ser representada por um código binário de 7 bits (um bit para cada segmento).

Exemplo para display de cátodo comum (1 = ligado, 0 = desligado):

Vantagens

  • Simples de implementar e interpretar.

  • Baixo custo de fabricação.

  • Boa visibilidade, mesmo a distância.

1.7. Código de Paridade

O Código de Paridade é um método simples de detecção de erros em transmissões e armazenamentos de dados digitais. Ele funciona adicionando um bit extra ao conjunto original de bits para indicar se a quantidade total de bits com valor 1 é par ou ímpar.

O objetivo é verificar se o dado transmitido ou armazenado foi alterado por ruídos ou falhas durante o processo. Embora não permita corrigir o erro, esse código facilita sua detecção imediata.

Tipos de Paridade

Existem dois tipos principais:

  1. Paridade Par (Even Parity)

    • O bit de paridade é definido de forma que o número total de bits 1 seja par.

    • Exemplo:

      • Dado original: 1010001 → contém 3 bits 1 (ímpar).

      • Bit de paridade: 1 (torna o total de 4 bits 1, ou seja, par).

      • Dado transmitido: 1010001 1

  2. Paridade Ímpar (Odd Parity)

    • O bit de paridade é definido de forma que o número total de bits 1 seja ímpar.

    • Exemplo:

      • Dado original: 1010001 → contém 3 bits 1 (ímpar).

      • Bit de paridade: 0 (mantém o total ímpar).

      • Dado transmitido: 1010001 0

Funcionamento Básico

Durante a transmissão ou leitura dos dados:

  1. Conta-se a quantidade de bits 1 no conjunto (incluindo o bit de paridade).

  2. Se o resultado não corresponder à paridade definida (par ou ímpar), considera-se que ocorreu um erro.

Vantagens

  • Simplicidade: fácil de implementar em hardware e software.

  • Baixo custo: requer apenas 1 bit adicional por conjunto de dados.

Limitações

  • Apenas detecta erros, não os corrige.

  • Ineficaz quando ocorrem erros em quantidade par de bits (pois a paridade se mantém).

Aplicações Comuns

  • Transmissão serial de dados (RS-232, UART).

  • Memórias antigas com ECC básico.

  • Sistemas de comunicação simples onde a taxa de erro é baixa.

Conclusão

Os códigos numéricos digitais representam a base da comunicação entre sistemas eletrônicos e digitais. Cada código estudado — como o Binário Puro, BCD (Binary Coded Decimal), Excess-3 (XS-3), Gray, Código de Paridade, Código de 7 Segmentos, entre outros — cumpre um papel específico na conversão, transmissão e exibição de informações.

O Binário Puro é o mais elementar, servindo como fundamento de toda a lógica digital. A partir dele, surgem códigos adaptados para facilitar o processamento e a leitura humana, como o BCD, que mantém a correspondência direta entre dígitos decimais e grupos de bits. Outros, como o Excess-3, trazem vantagens em operações aritméticas e detecção de erros simples.

O Código Gray destaca-se por minimizar erros em transições de estados, sendo vital em sistemas de medição e encoders. Já o Código de Paridade atua como mecanismo básico de detecção de falhas, garantindo maior confiabilidade na transmissão de dados. Por fim, o Código de 7 Segmentos materializa a representação visual dos números, sendo essencial em displays e dispositivos de interface com o usuário.

A escolha do código mais adequado depende diretamente do contexto de aplicação:

  • Processamento interno e cálculos → Binário Puro, BCD, Excess-3.

  • Controle e posicionamento → Código Gray.

  • Transmissão segura de dados → Código de Paridade e códigos com bits redundantes.

  • Exibição visual → Código de 7 Segmentos.

Em síntese, compreender os diferentes códigos numéricos digitais é fundamental para projetar sistemas mais eficientes, precisos e confiáveis. Eles não apenas traduzem números para a linguagem das máquinas, mas também tornam possível que informações digitais sejam processadas, transmitidas e apresentadas de forma acessível e funcional. A integração correta entre esses códigos garante que dispositivos modernos — de simples relógios digitais a complexos sistemas de automação — funcionem de maneira sincronizada e segura.

Limitações

  • Restrito a caracteres numéricos e algumas letras simples (A, b, C, d, E, F).

  • Não permite exibir textos completos de forma legível.

Aplicações Comuns

  • Relógios digitais.

  • Calculadoras.

  • Painéis de instrumentos automotivos.

  • Equipamentos de medição industrial.